Chegar ao centenário com saúde e lucidez. Eis o grande sonho de boa parte das pessoas, não é? Há uma receita para realizá-lo? Se houver, a aposentada Antônia Ferreira dos Santos, de 102 anos e meio, reúne todos os ingredientes. Dona Tonha, como é carinhosamente chamada, ilustre moradora do bairro Conceição, em Itabuna, teve a vida regada às mais diversas formas de arte.
![DSC09353essa](https://lh3.googleusercontent.com/blogger_img_proxy/AEn0k_v_dlx_AGa5LarmBWsZOJnMSnnG-dfe3WMd74GOEUDsc4eWExKvWqptc_zJWC1BVJG6nVesPMSvdBO70Wpt0orE6cX14AKlPKYemNGK2qkg_0J2XcVJrXxv=s0-d) |
A felicidade estampada no rosto de Antonia Ferreira dos Santos |
Com um sorriso largo, ela nos recebeu em sua casa, onde pudemos conhecer uma história cheia de criatividade e emoção. Para nosso bate-papo, não quis colocar o aparelho auditivo. "Prefiro meu ouvido natural", justificou. Como sempre, tinha acordado às 6h30min da manhã. Diante da voz firme e do olhar ativo, comentamos sobre a aparência saudável dela. "Eu sou muito forte e muito feliz, graças a Deus. Não tenho do que me queixar. Tive uma vida feliz, uma vida forte", atestou.
As habilidades da matriarca, de cinco filhos, cinco netos e quatro bisnetos, já se manifestaram na arte de encenar peças teatrais; recitar poesias (que aprendeu de ouvido, pois tem pouca escolaridade); costurar até vestidos de noiva; fazer trabalhos artesanais e no dedilhar do cavaquinho. Isso para citar apenas alguns dos tantos dotes dessa mulher de espírito absolutamente juvenil.
Perguntada sobre como aprendeu a tocar cavaquinho, contou que foi ainda quando solteira. Modesta, disse que não se lembrava mais como entoar músicas naquelas cordas. Mas, quando pedimos para fotografá-la com o instrumento na mão, surpresa! Dona Tonha tocou por longos 12 minutos. Concentrada nos acordes, como se estivesse sozinha na sala, ela reconheceu: a música traz alegria.
Por mais de 20 anos – até os 92 –, praticou ioga duas vezes por semana. Talvez venha, também, daí a força que encontra até hoje para dar uma volta por dois quarteirões, nas manhãs de sol, acompanhada do fisioterapeuta com quem se exercita diariamente. Durante o passeio, acena para a vizinhança e observa as casas que foram pintadas, avaliando se estão bonitas ou não. Ah! Antes de sair de casa, cabelos bem penteados, relógio no pulso, brincos e, claro, a inseparável Alfazema. Perguntada se é vaidosa, a charmosa centenária nega. Mas ressalva: "Quem não gosta de se sentir bonita?".
Cardápio da longevidade
A título de curiosidade, para contemplar os adeptos das cartilhas pró-longevidade, o cardápio servido a dona Tonha. Tudo supervisionado pelas filhas Adriene e Arlene, que moram com ela. - Pela manhã, frutas;
- Às 10 horas, barra de cereais;
- Almoço – salada, arroz integral, duas colheres de feijão, frango (raramente carne, peixe uma ou duas vezes por semana);
- Às 15 horas – iogurte com aveia;
- Jantar – sopa de verdura;
- Ceia – pão integral com queijo frescal e leite desnatado ou chá.
Sabedoria da vida
![DSC09337essa](https://lh3.googleusercontent.com/blogger_img_proxy/AEn0k_uqQdMImlLZZU2u1uIUDGg8cWpNe9DSibB4qjQaUK5wdguNAQZ7QnVwWBJ60wWJOQ584YepTZyClvkWNW0LWsDBUQIRenOI0DhNYdjep5tkwqIC9_kDWM0=s0-d)
Nascida no município baiano de Candeal, Antônia Ferreira dos Santos veio para Itabuna ainda mocinha. Casou-se, morou e trabalhou em fazenda de cacau, mas quis fixar-se definitivamente na cidade, para que os filhos – Adriene, Arlene, Adilson, Aderval e Augusto – pudessem dar continuidade aos estudos. "Ela disse que só leu o ABC, a cartilha e o primeiro livro. O resto foi a sabedoria da vida. Quando tinha 65 anos, foi para a escola de culinária, porque disse que queria ter o primeiro diploma da vida", contou Adriene.
A religiosidade também sempre foi presente na vida de Dona Tonha, que é da Igreja Batista Teosópolis. Pela manhã e à noite, ela lê a Bíblia e costuma ir à igreja sempre que possível, aos domingos. "Conheceu Pastor Hélio?", perguntou, sobre o saudoso líder da congregação em que foi batizada.
Diante de uma trajetória tão dinâmica e do privilégio de envelhecer com a vitalidade preservada, com o quê ainda sonha essa centenária mulher? – questionamos. Ao que Dona Tonha revelou: "Sonho em ter saúde, acompanhar minhas filhas, fazer o que elas não possam fazer. Que eu esteja presente". Indagada se quer ver os bisnetos crescerem, ela foi taxativa: "Quero! Se Deus consentir. A gente sempre quer ter muita saúde e muita vida, não é? Aí Deus é quem sabe".
Durante a entrevista, Dona Tonha recitou duas poesias. Uma delas, intitulada "Sempre se lembre", retrata com perfeição o olhar de alguém cujo desejo maior é viver com intensidade – independentemente das limitações que apareçam pelo caminho. Segue um trecho. Recitemos também!
Sempre se lembre que a pele se enruga
os cabelos se tornam brancos
e os dias se transformam em anos
mas o importante não muda:
tua força, tua segurança não tem idade
(...)
enquanto estiveres viva, sinta-se viva
se fizeres algo diferente, volte a fazê-lo
não vivas de fotos amareladas
segue em frente, embora todos esperem que desista
quando, devido à idade, não possa correr, ande depressa
quando não puder andar depressa, caminhe
quando não puder caminhar, use a bengala
mas não pare nunca